Em meio a protestos, o Senado da Argentina aprovou na 4ª feira (12.jun.2024) a Lei de Bases, conhecida como “Lei Ônibus”. O texto inclui uma controversa delegação de poderes legislativos à Presidência da República, privatizações, incentivos a investimentos e uma minirreforma trabalhista.
O governo tem minoria na Câmara e no Senado e teve que negociar para aprovar o projeto. O texto original tinha 664 artigos, mas foi reduzido a 1/3 (232 artigos) para passar na Casa baixa em abril.
No Senado, o debate durou mais de 11 horas. Em uma 1ª votação, a legislação foi aprovada por 37 votos a favor e 35 contra. Porém, a votação teve de ser refeita depois de uma senadora dizer ter se confundido e marcado a opção errada.
Na 2ª votação, o placar ficou empatado, com 36 votos contra e 36 a favor. Coube à vice-presidente Victoria Villarruel desempatar. Na Argentina, o vice-presidente também é presidente do Senado e tem direito ao voto de minerva.
“Hoje existem duas Argentinas, uma violenta, outra dos trabalhadores”, disse Villarruel ao justificar o voto. “Por esses argentinos que sofrem, esperam e não querem ver seus filhos saírem do país, que merecem recuperar seu orgulho, meu voto é afirmativo”, completou.
Agora, o texto volta à Casa Baixa, pois foi alterado pelos senadores. Se passar sem alterações, irá à sanção presidencial.
O resultado da votação marca a 1ª vitória legislativa de Milei em pouco mais de 6 meses de governo. Depois da aprovação, o gabinete Presidencial publicou uma nota no X (ex-Twitter) comemorando o resultado da votação.
“Esta noite é um triunfo para o povo argentino e o 1º passo para a recuperação da nossa grandeza, tendo aprovado a reforma legislativa mais ambiciosa dos últimos 40 anos”, diz o documento.
“O Poder Executivo destaca o trabalho patriótico dos Senadores da Nação que contribuíram com seu voto positivo para a aprovação desta lei e espera continuar contando com seu compromisso para deixar para trás as políticas de fracasso e miséria, e reinserir a República Argentina no caminho para a prosperidade e o crescimento”, completou a Presidência.
Lei de bases
Segundo o Executivo da Argentina, a Lei de Bases vai ajudar o país a sair de uma grande crise econômica herdada das gestões anteriores. Para isso, o texto dá poderes especiais ao governo do presidente Javier Milei por meio de um decreto de estado de emergência.
Assim, Milei poderá legislar por decreto (sem passar pelo Congresso) “em questões administrativas, econômicas, financeiras e energéticas pelo período de 1 ano”. O presidente argentino também terá o poder de dissolver organismos públicos.
Para que a legislação passasse no Legislativo, o governo teve que ceder em relação a alguns pontos. Entre eles está a redução de 11 para 4 áreas que Milei poderá legislar sem votação dos deputados e senadores.
Outra modificação ocorreu no trecho que trata das privatizações. A princípio, mais de 40 estatais estavam na lista. No texto aprovado no Senado sobraram 8. Foram retiradas do plano de privatização: a Aerolíneas Argentinas, o Correo Argentino e veículos de comunicação estatais que fazem parte da Radio y Televisión Argentina, por exemplo. Já a Agua y Saneamientos Argentinos segue na lista de companhias que poderão ser vendidas à iniciativa privada.
A legislação aprovada também inclui uma minirreforma no regime de aposentadorias. O texto propunha a derrubada de uma moratória previdenciária que permite a mulheres a partir dos 60 anos se aposentar mesmo sem ter cumprido os 30 anos de contribuição exigidos, podendo pagar os aportes que faltavam em parcelas. Porém, o governo aceitou abdicar da medida. Também recuou no corte de 100% do financiamento de obras públicas no país.
Entre as vitórias de Milei está a aprovação do Rigi (Regime de Incentivos a Grandes Investimentos), que deve ajudar o governo a aumentar o estoque de dólares do país. A proposta anexada à Lei de Bases prevê a distribuição de incentivos, como o corte de impostos, a empresas que invistam pelo menos US$ 200 milhões em áreas como petróleo, gás e mineração.
Protestos
Enquanto os senadores debatiam o projeto, manifestantes e agentes de segurança entraram em confronto do lado de fora. Pelo menos 3 deputados da Unión por La Patria –coligação do ex-presidente Alberto Fernández– que estavam entre os manifestantes foram hospitalizados com queimaduras nos olhos depois de serem atingidos pela polícia com gás lacrimogêneo. São eles: Eduardo Valdés, Luis Basterra e Juan Manuel Pedrini.
As Forças de segurança também usaram um caminhão com canhão de água e balas de borracha para tentar dispersar o protesto. Em resposta, os manifestantes atiraram pedras, coquetéis molotov e garrafas contra os policiais e incendiaram carros e lixeiras. Segundo o jornal argentino Clarín, 30 pessoas foram presas e pelo menos 20 policiais ficaram feridos. O número total de feridos não foi informado pela polícia.
Dentro do Congresso, o senador da oposição Wado de Pedro pediu que a votação fosse paralisada para tratar dos episódios de violência que aconteciam na Praça do Congresso. Mas o pedido foi negado e a sessão prosseguiu.
Em post no X, o gabinete de Milei parabenizou as forças de segurança “pela sua excelente ação reprimindo grupos terroristas com paus, pedras e até granadas que tentaram dar um golpe de Estado, atentando contra o funcionamento do Congresso”.
A ministra da Segurança, Patricia Bullrich, disse que os responsáveis por incendiar um carro de uma estação de rádio vão pagar com uma pena “que não será leve”.
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