Parte da equipe econômica debate BC autônomo, mas vê trava no Planalto

Com a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 65 em discussão no Senado, parte da equipe econômica do governo federal debate internamente a autonomia ampla do Banco Central. A proposta defende que o orçamento da autoridade monetária seja independente das contas da União.

Entretanto, há uma percepção de que as opiniões fortes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de seus aliados travam as discussões sobre o tema no âmbito do Executivo, segundo apurou o Poder360.

As discussões públicas sobre o tema muitas vezes são tratadas no âmbito do Orçamento Federal, por causa da ideia de desvinculação. O time responsável por esse assunto acompanha as discussões em relação à autonomia ampla da autoridade monetária. A questão orçamentária não é necessariamente vista como um problema.

A ressalva do time econômico, especialmente do Ministério da Fazenda, em relação ao Banco Central seria a falta de diálogo do BC com o governo. Como mostrou o Poder360, há um incômodo no ministério liderado por Fernando Haddad com ações tomadas pela autoridade monetária sem uma conversa prévia.

Essa percepção é vista em falas públicas de ministros de Lula. Em março, Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) disse ser contra pensar sobre a autonomia por meio de uma PEC. Segundo ela, não seria determinação do Congresso Nacional definir o tema.

Questionado na tarde desta 3ª feira (9.jul.2024) sobre a defesa da autonomia ampla do Banco Central por 5 dos 9 integrantes da diretoria da autoridade, o ministro Haddad disse que não poderia comentar sobre o assunto.

O projeto consta na pauta desta semana da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, mas o Poder360 apurou serem grandes as chances de a votação ser adiada. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que não pretende pautar a PEC de bate-pronto quando chegar ao plenário.

AUTONOMIA FINANCEIRA

Em artigo publicado nesta 3ª feira (9.jul) pelo Poder360, os diretores do BC Ailton Aquino (Fiscalização), Diogo Guillen (Política Econômica), Otávio Damaso(Regulação) e Renato Gomes (Organização do Sistema Financeiro e Resolução) afirmam que a PEC alinhará o BC às melhores práticas internacionais.

Além dos 4 diretores, o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, já defendeu em diversas ocasiões a ampliação da autonomia da autoridade monetária do Poder Executivo. 

O Banco Central obteve autonomia operacional em fevereiro de 2021, que estabeleceu regime de mandatos de 4 anos para os 9 integrantes do Copom (Comitê de Política Monetária). A medida permite a decisão do patamar da taxa de juros com maior independência do Poder Executivo. 

Os favoráveis à PEC 65 defendem ser preciso também dar independência financeira e orçamentária à autoridade monetária. Levantamento do FMI (Fundo Monetário Internacional) mostrou que, de 87 bancos centrais, 64 avaliam que ter um orçamento próprio é a principal métrica para medir a autonomia. 

Além disso, 90% dos bancos centrais com autonomia operacional também possuem autonomia orçamentária e financeira. 

Segundo artigo assinado pelos 4 diretores do BC, a proposta assegura recursos adequados para a manutenção da excelência de suas entregas à sociedade e a ampliação de “sua bem-sucedida agenda de inovação do sistema financeiro”.

Defenderam que, se aprovada, a PEC 65 alinhará o BC brasileiro às melhores práticas internacionais. 

“O fortalecimento institucional do BC, pilar de credibilidade, contribuirá para que a preservação do poder de compra da moeda seja alcançada por meio de uma política monetária guiada pelos mais exigentes critérios técnicos, minimizando assim os custos para a atividade econômica”, disse o artigo. 

Os diretores disseram que o BC tem implementado uma “revolucionária” agenda de inovação, com enormes benefícios para a sociedade. Citaram o Pix, que, segundo eles, promoveu a inclusão bancária de mais de 70 milhões de brasileiros.

O artigo disse que a PEC não modifica as competências do CMN (Conselho Monetário Nacional) na definição da meta de inflação e nas diretrizes para as políticas monetária, creditícia e cambial.

“Essa autonomia pertence a uma longa agenda de aperfeiçoamento da instituição, perseguindo razões de Estado que superam ideologias e trazem benefícios inequívocos ao país. Assim, é imprescindível que demos esse importante passo em direção à autonomia orçamentária e financeira do BC, de forma que a instituição expanda, ainda mais, a sua capacidade de bem servir o Brasil”, disseram os diretores. 

PEC 65 DE 2023

A proposta que tramita no Senado estabelece que o Banco Central é uma instituição de natureza especial com autonomia técnica, operacional, administrativa, orçamentária e financeira e que seria classificada como “empresa pública que exerce atividade estatal”

O orçamento anual de custeio e de investimento do Banco Central seria aprovado pela comissão temática pertinente do Senado Federal, no caso a CAE (Comissão de Assuntos Econômicos).

Caso aprovada, a autonomia financeira permitiria que o Banco Central utilizasse de receita própria com os seus ativos para custear suas despesas com pessoal, despesas gerais e outros investimentos. Já a autonomia orçamentária permitiria que o Banco Central elaborasse, aprovasse e executasse seu próprio orçamento de forma separada e independente do governo. 

Funcionários e diretores do BC afirmam que a instituição tem restrições orçamentárias e que a PEC ajudaria a melhorar o quadro de colaboradores. O presidente do BC, Roberto Campos Neto, já disse que o envelhecimento do quadro de profissionais faz com que uma pessoa sênior tenha que fazer o trabalho de uma pessoa júnior pela falta de equipe. 

O Banco Central está desde 2013 sem ter novos concursos. O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos autorizou a realização de um exame, que deve ser feito em agosto deste ano. A expectativa é que tenha 100 vagas, segundo 50 para atividades de tecnologia da informação e 50 para atividades relacionadas às demais áreas do Banco Central.

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