O TCU (Tribunal de Contas da União) aprovou, por unanimidade, as contas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no ano de 2023. O relator, ministro Vital do Rêgo, apresentou ressalvas. O processo segue para análise do Congresso Nacional. Eis a íntegra do relatório (10,7 MB).
Entre as principais distorções financeiras apresentadas pelo ministro, estão:
- R$ 20,0 bilhões em distorções e R$ 144,6 bilhões em limitações nos ativos totais da União;
- R$ 2,8 bilhões em distorções e R$ 8,4 bilhões em limitações de escopo do passivo exigível da União;
- R$ 20,4 bilhões em distorções no patrimônio líquido;
- R$ 9,9 bilhões em distorções no resultado patrimonial.
Ao todo, as ressalvas somam R$ 206,1 bilhões.
O volume de recursos fiscalizados, apenas nas auditorias do TCU, foi de R$ 14,5 trilhões na perspectiva patrimonial, que considera os bens e direitos, e as obrigações e o patrimônio líquido da União. O montante fiscalizado referente a perspectiva orçamentária foi de R$ 4,7 trilhões.
Durante a apresentação de seu parecer, o ministro Vital do Rêgo destacou a necessidade de o governo federal frear a concessão de benefícios tributários. Segundo o relator, o cenário financeiro brasileiro se agravou nos últimos anos com o aumento de renúncias fiscais, que no final não apresentaram os resultados esperados. O montante das renúncias fiscais alcançou 6% do PIB (Produto Interno Bruto).
Vital do Rêgo citou como exemplo a desoneração da folha de pagamento. O relatório aponta que a renúncia fiscal com a desoneração foi de R$ 148 bilhões desde 2012, mas que a medida apresentou pouca efetividade na manutenção e geração de empregos ao longo dos últimos 12 anos. Mesmo sem efetividade o benefício foi ampliado de 5 setores para 17 ao longo dos anos.
Vital sugeriu que a continuidade do benefício esteja condicionada a contrapartidas para essas empresas, como a manutenção ou aumento do número de empregos formais. “A intenção é que a União pare de se endividar, pagando juros altíssimos, ao mesmo tempo em que concede esse tipo de benefício”, disse o relator.
O ano de 2023 também se destacou por ser um “ano de waiver fiscal”– dispensa de uma exigência ou de obrigações financeiras– em função da mudança das regras orçamentárias e o pagamento de precatórios. Praticamente todas as regras de finanças públicas foram suavizadas no exercício financeiro do ano passado.
Leia abaixo os destaques do relatório do ministro Vital do Rêgo:
CONJUNTURA ECONÔMICA, FINANCEIRA E ORÇAMENTÁRIA
- a inflação verificada no exercício foi de 4,62%, acima da meta fixada em 3,25%, mas dentro da margem de 1 ponto percentual e meio, para cima ou para baixo;
- redução da taxa básica de juros de 13,75% para 11,65%;
- a carga tributária brasileira caiu de 33,07% do PIB, em 2022, para 32,44%, em 2023, mas apresentou um aumento de 0,93% na arrecadação tributária bruta;
- a arrecadação de receitas primárias alcançou R$ 2,35 trilhões, superando em 4% a estimativa inicial da LOA (Lei Orçamentária Anual);
- elevação das despesas primárias em função do pagamento de precatórios e ao crescimento dos benefícios previdenciários, tendo totalizado R$ 2,13 trilhões, equivalentes a um salto de 18% ante 2022;
- os regimes de previdência apresentaram, no conjunto, deficit de R$ 428 bilhões, 9% maior que o de 2022;
- a previdência rural, dentro do RGPS (Regime Geral de Previdência Social), respondeu por quase 60% do deficit do regime, ainda que abrangendo somente 26% do total de benefícios;
- o saldo da DLSP (Dívida Líquida do Setor Público), que engloba as contas da União, dos Estados, dos Municípios e das respectivas estatais não financeiras (exceto Petrobras), computou R$ 6,6 trilhões, subindo de 56% para perto de 61% do PIB;
- a dívida pública federal–a soma das dívidas da União– atingiu R$ 6,5 trilhões em 2023, o que representa um acréscimo de 9,5% em relação ao ano anterior. Esse aumento estava dentro do previsto no Plano Anual de Financiamento;
- as maiores despesas do orçamento em 2023 foram com Previdência Social (49%), Assistência Social (13,5%), Saúde (9%) e Educação (7,5%).
RESULTADOS DA AÇÃO GOVERNAMENTAL
- 51 metas presentes no PPA (Plano Plurianual) 2020-2023, tiveram grau de cumprimento superior a 85%, e 32 foram consideradas integralmente cumpridas;
- na educação básica, a principal meta envolvia o alcance do patamar de 5,59 no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), objetivo que não foi alcançado em nenhum dos anos abrangidos pelo PPA;
- na saúde pública, mais de 169 milhões de pessoas foram assistidas por 57.000 equipes de saúde da família e de atenção primária, superando a meta;
- ampliação dos serviços de radioterapia ficou aquém do esperado, atingindo apenas 60 novos serviços, quando a meta era de 92;
- o novo Programa Bolsa Família executou cerca de R$ 71 bilhões;
RENÚNCIA DE RECEITAS
- em 2023, foram instituídas 32 desonerações tributárias, com impacto negativo de R$ 68 bilhões na arrecadação. No final do exercício, o volume de gastos tributários chegou a R$ 519 bilhões, acréscimo anual de 8%;
- com esses R$ 519 bilhões seria possível neutralizar a expansão da dívida pública federal ocorrida em 2023, ou ampliar mais de 3 vezes o Programa Bolsa Família, ou ainda cobrir com folga o déficit de todos os sistemas previdenciários do ano passado;
- de cada R$ 5 reais que poderiam ser arrecadados, R$ 1 é convertido em benefício fiscal e não entra no caixa do Tesouro;
- a Emenda Constitucional 109 de 2021 previa a redução gradual dos benefícios tributários até que, em 8 anos, o seu montante não ultrapassasse 2% do PIB. Já se vão 3 anos desde então, e a relação entre os gastos tributários e o PIB tem se mantido perto de 5%;
- a Petrobras foi a maior beneficiária de renúncias fiscais, com R$ 29 bilhões em benefícios tributários;
- o estoque de créditos tributários previdenciários inscritos na dívida ativa da União, cresceu de R$ 307 bilhões para R$ 704 bilhões no período 2014-2023.