Juros estão altos por causa do desbalanceamento fiscal, diz Gerdau

Os juros estão altos no Brasil por causa do desbalanceamento fiscal. É o que diz o empresário Jorge Gerdau Johannpeter, 87 anos. Para ele, falta ao atual governo, de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), interesse em debater corte de gastos. Por outro lado, o Congresso já deu demonstrações que não aceita novos aumentos de impostos.

O resultado, diz, é uma pressão inflacionária crescente. E o Banco Central não tem outra opção que não manter os juros nos patamares atuais para impedir que a alta de preços se descontrole.

O governo trabalha para aumentar a arrecadação e o Congresso não tem aceitado esses projetos. Isso está nos levando ao risco de que não venham receitas na proporção da criação das despesas e pode levar a um processo inflacionário. Tem que procurar equilíbrio fiscal. No mundo, está praticamente consolidado o cuidado com políticas fiscais. Se a receita não vem, se trabalha na diminuição de despesas. Por enquanto, o presidente Lula tem evitado atacar o tema”, disse em entrevista exclusiva ao Poder360.

Assista à íntegra (21min28s):

Para Gerdau, o nível ideal da taxa de juros deveria considerar o centro da meta da inflação (3%) mais 3 a 4 p.p. Hoje, está 7,5 pontos acima –a 10,5% ao ano.

O empresário criticou as exceções na reforma tributária. Segundo ele, são as principais razões pelas quais a taxa de impostos deve ser de até 27%. Se houvesse menos exceções, poderia cair para níveis internacionais, próximos a 20%. Sugere a criação de um teto de cobrança tributária. E as exceções teriam de se adaptar a esse patamar, sem extrapolar os limites.

Jorge Gerdau é presidente do Conselho de Administração da Gerdau e presidente do Conselho do MBC (Movimento Brasil Competitivo). Ele participou, em Brasília, da 2ª edição do Fórum de Competitividade, que discutiu a digitalização da economia e o uso de inteligência articifical. E falou com o Poder360.

Leia trechos da entrevista:

Poder360: O senhor é o presidente do conselho do MBC (Movimento Brasil Competitivo). Vocês pregam uma maior digitalização do governo e da indústria. Como isso impacta na competitividade?
Jorge Gerdau: É muito importante olhar o cenário global e a competitividade de todos os setores no campo empresarial de uma forma geral. E os instrumentos que as tecnologias digitais trazem modernizam e reduzem enormemente o custo e o tempo de trabalho. Essas novas tecnologias são decisivas. Eu diria que hoje países como o Brasil, que ainda têm atraso em um ou outro campo, com a digitalização podem atingir patamares como os internacionais de maneira ágil. Por isso tanta atenção no tema e um esforço para ajustarmos o país a esse novo modelo e situação.

Como a digitalização pode reduzir de forma rápida o custo Brasil?
A redução passa por utilizar mecanismos tecnológicos e por uma definição macroestrutural em que todos os componentes de custo Brasil sejam analisados pelo benchmark internacional. Por isso a importância desse caminho.

O governo Lula tem demonstrado interesse em fazer o debate sobre a redução do custo Brasil?
Temos tido avanços e diálogos importantes. Tem uma novidade, que é uma secretaria dentro do Mdic [Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio] focada em reduzir o custo Brasil. Além da estrutura dentro do governo federal, o vice-presidente [Geraldo] Alckmin tem conhecimento dessa matéria devido à experiência anterior em São Paulo. No Legislativo, temos a frente parlamentar [do Brasil Competitivo]. Além disso, há a mobilização empresarial junto ao MBC. Agora, o avanço do processo passa pela maturação política e um trabalho de grande envergadura.

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Jorge Gerdau cumprimenta o presidente da Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo, deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), durante o Fórum de Competitividade de 2024

Onde está mais avançado o debate: no Congresso ou no Executivo?
Diria que está sendo feito nas duas partes. Os trabalhos estão avançando. Um dos principais fatores hoje é a criação do IVA para acabar com a cumulatividade tributária, um dos grandes problemas do país. A reforma tributária acaba com isso. Infelizmente é um encaminhamento de médio prazo. Os debates sobre a energia elétrica também tem avançado. A cobrança tem sido usada como instrumento arrecadatório, com encargos, etc. A realidade internacional é que você não pode usar estruturas arrecadatórias diversas para impedir a competitividade. Estimamos em R$ 1,7 trilhão por ano o custo Brasil. Vários fatores têm que ser corrigidos. A remuneração do trabalho, que tem encargos que em outros países não têm. Na maior parte dos casos, os operários levam 70% do dinheiro total que ele custa. No Brasil, é praticamente a metade. As bases técnicas estão bem estruturadas. Agora é o trabalho político.

A reforma tributária oferece algum risco?
O texto elimina a cumulatividade. O IVA, no seu conceito filosófico, estabelece claramente não ter cumulatividade de nenhum tipo. Agora, o tema é complexo. Nos debates de alteração da estruturação da energia elétrica deve-se manter o custo atual porque há setores como alumínio, petroquímica, bases relevantes, não podem ter cumulatividade. Temos que entrar nos padrões internacionais que acabam com qualquer tipo de cumulatividade para ter condições de igualdade de competição na exportação e na importação.

E as exceções, como avalia?
Pessoalmente tenho um conceito de que o teto do nosso imposto deveria ficar na média do IVA no mundo, de 20,5% a 21%. O Brasil, pela abundância de exceções, está com indícios de que vai chegar a até 27%. Isso é uma oneração desproporcional na estrutura brasileira e no meu entender deveria ter um teto. Quando bate no teto, não pode fazer mais exceção. Tem que reacomodar. Se não, vai fazer o Brasil, que tem uma estrutura injusta e elevada, atingir patamares piores ainda.

Como o senhor avalia o 3º governo Lula?
Eu acho que tem que se respeitar o presidente Lula por sua experiência e vivência na condução do Brasil. Agora, o macro debate no qual o governo trabalha para aumentar a arrecadação e o Congresso não tem aceitado esses projetos está nos levando ao risco de que não venham as receitas na proporção da criação das despesas. Isso pode levar a um processo inflacionário. Tem que procurar equilíbrio fiscal. No mundo está praticamente consolidado o cuidado com políticas fiscais. Se a receita não vem, se trabalha na diminuição de despesas. Por enquanto, o presidente Lula tem evitado atacar o tema, embora nos últimos debates já tenha dado indicações dessa necessidade. É um momento de indefinição.

Como o senhor avalia a taxa de juros no Brasil?
O custo dos juros no Brasil realmente é muito elevado. Mas não é nada novo. Sempre tivemos custo elevado. O Banco Central está trabalhando com cuidado porque está observando o desbalanceamento global entre receita e despesa e tudo indica que estamos com algum risco de aumento de inflação. Consequentemente, essa caminhada de redução dos juros foi interrompida. Tivemos um momento de juros extremamente altos em consequência dos Estados Unidos, onde os juros estão acima de 5%, elevadíssimo. No Brasil deveria ser 3,5 a 4 pontos percentuais acima da inflação. Estamos com mais de 6. Esse número deve ser atingido com a confiabilidade de que as contas de receita e despesa fecham. No momento, estamos com um quadro de indefinição. Por isso os juros estão onde estão.

Qual o maior problema macro do Brasil hoje em dia?
São 2. De um lado, temos que focar totalmente na educação básica, que está estagnada ou piorando. É o fator mais importante para melhorar as condições sociais, produtividade e crescimento. É vergonhoso estarmos estagnados nesses índices. O 2º é que os países que mais prosperam têm índice de poupança e investimento elevado. O melhor exemplo são a Índia e a Coreia do Sul. A Coreia é muito particular, mas a Índia se parece com o Brasil. Aqui temos pobreza. Eles têm pobreza e miséria. Mas tem feito uma poupança próxima a 26% do orçamento. E crescem de 6% a 7% ao ano há 10 anos. No Brasil, o índice de poupança do setor público é quase zero. Crescemos de 2% a 2,5%, próximo do índice de crescimento da população. O foco deveria ser em quanto aumentar a renda per capita. Essa discussão praticamente não existe. Nada mais social que o emprego. É o melhor modo de fazer justiça e desenvolvimento social. O não investimento é consequência de políticas globais e governamentais. Deveria ser feito 2 ou 3 anos de esforços para chegar a patamares próximos à Índia.

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