O prazo para a entrega do relatório de transparência salarial, que inclui os critérios remuneratórios do último semestre de 2023, termina nesta 5ª feira (29.fev.2024). O documento passou a ser obrigatório para empresas que tenham 100 ou mais funcionários com carteira assinada em julho do ano passado, quando a lei que estabelece igualdade salarial entre homens e mulheres (Lei nº 14.611) foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O não cumprimento por parte das companhias pode resultar em multa administrativa de até 3% da folha de salários, limitada a 100 salários mínimos. Multa por discriminação salarial também está prevista. O preenchimento das informações deve ser realizado através do Portal Emprega Brasil.
Dados específicos de salários e ocupações serão compilados pelo Ministério do Emprego e do Trabalho via eSocial, onde as empresas já preenchem periodicamente informações sobre os funcionários. Neste momento, são necessários dados adicionais sobre ações de apoio à contratação e promoção de mulheres.
Para regularizar a situação, se constatada a desigualdade salarial, as empresas vão precisar apresentar um plano de ação (Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios) no prazo de 90 dias.
O que diz a lei
A Lei nº 14.611, sancionada em julho de 2023, estabelece transparência na remuneração de profissionais com cargos equivalentes. O não cumprimento pode resultar em multa de até 3% dos salários.
O decreto nº 11.795 publicado em novembro de 2023, regulamenta a forma como a transparência de dados deve ser feita. O texto exige um relatório por semestre. Deve ser enviado nos meses de março e setembro, e planos de ação para mitigação da desigualdade salarial.
Na portaria nº 3.714, o Ministério do Trabalho e Emprego estabelece os procedimentos administrativos e fiscais para a atuação do órgão. Ainda, determina como o relatório semestral deve ser feito. Descreve que os dados imputados pelas empresas no Portal Emprega Brasil serão compilados junto com as informações extraídas do eSocial e que a publicação do relatório elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego deve ser feita “pelos empregadores em seus sítios eletrônico, redes sociais ou em instrumentos similares”.
A norma determina que o aplicativo da Carteira de Trabalho Digital disponibilize ferramenta para o reporte de denúncias de discriminação, sem prejuízo da criação de outros canais para esta mesma finalidade.
Justiça dá ok para lei
A Justiça do Paraná derrubou na 3ª feira (27.fev) a ação protocolada pelo Sivepar (Sindicato Intermunicipal das Indústrias do Vestuário do Paraná) contra a lei. A categoria pedia para que as empresas associadas não fossem obrigadas a divulgar o relatório de transparência da remuneração entre homens e mulheres. O juiz entendeu que não cabia o pedido de mandado de segurança coletivo pleiteado na ação.
Norma desde 1952
A igualdade salarial entre homens e mulheres já era definida por lei desde 1943, explicou a coordenadora da área de Compliance da Silveiro Advogados, Ana Paula Ávila, ao Poder360. A Lei nº 5.452 dizia, à época, que a “igualdade de salário por trabalho do mesmo valor, sem distinção de sexo”.
Brechas na lei são criticadas
A Lei atual de Igualdade Salarial tem criado uma série de questionamentos entre as empresas, disse Ana Paula Ávila. A falta de clareza no texto sobre como os dados internos serão divulgados, conforme afirmou, abre brecha para diferentes interpretações e “expõem falta de conhecimento sobre leis complementares”, como a da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), por exemplo.
Para ela, a imprecisão reside na forma em como os dados internos das empresas serão divulgados. Enquanto o documento estabelece o compartilhamento nas redes sociais dos salários de homens e mulheres em cargos equivalentes, não há normas claras sobre o método da publicação. Segundo ela, essa situação que implica em quebra de sigilo sobre os dados internos da empresa.
“Nem a lei, nem o decreto e nem a portaria esclarece o formato da anonimização. Quando eu tenho uma informação de salário, cargo e sexo, eu consigo além de entender os critérios que ela utiliza na precificarão dos produtos, dar abertura para um aliciamento de profissionais”, disse a advogada. Segundo ela, a concorrência tendo transparência enquanto ganha um funcionário de uma outra empresa, pode lhe oferecer mais remuneração para que mude de companhia, o que afeta o mercado.
“Faltou a legislação conversar com a Lei Geral de Proteção de Dados”, afirmou Ana Paula. O Ministério das Mulheres explicou, em uma live em 7 de fevereiro, que as informações seriam, na verdade, compiladas pelo órgão, divulgadas estatisticamente e essa pesquisa deveria ser divulgada pelas empresas nas redes.
“O problema não é a lei, é a falta de clareza dela”, afirma a advogada. “A portaria publicada depois para regulamentar contraria o decreto. Tanto a lei, quanto o decreto dizia que as empresas deveriam divulgar o relatório. Na portaria dá a entender, porém, que o relatório será elaborado pelo Ministério do Trabalho com base nas informações disponibilizadas”, falou.
Cenário ideal
A coordenadora da área de Compliance da Silveiro Advogados fez sugestões para que a lei funcione e não crie dúvidas as empresas:
- aproveitar as informações em bancos de dados já existentes;
- encontrar as empresas com desigualdade salarial entre homens e mulheres; e
- fiscalizar o descumprimento para então aplicar as multas previstas.
Ana Paula concluiu: “O bom da lei são os canais de denúncia agora criados, que são efetivos para elevar a informação de disparidade até as autoridades. Mas duas coisas ainda competem ao Ministério do Trabalho: acessar a denúncia e fiscalizar”.