As agências reguladoras federais têm enfrentado um problema que se agrava cada vez mais: a falta de pessoal. As entidades de regulação estão com cerca de 1/3 dos seus postos desocupados, com 3.708 cargos vagos de um universo de 11.522. É o que mostra levantamento feito pelo Poder360 junto às 11 agências federais.
A pior situação é da ANM (Agência Nacional de Mineração), a mais nova das 11. Criado em 2017 a partir do antigo DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), o órgão tem 62% dos postos não preenchidos. Das 1.728 vagas previstas em lei, 650 estão ocupadas. Dentre esses, há 205 pessoas recebendo abono de permanência, ou seja, podem se aposentar a qualquer momento.
Na sequência, a maior falta de pessoal é na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), com 47,7%. Recentemente a entidade encaminhou ao governo pedido de concurso público para preencher 343 das suas 806 vagas desocupadas para cargos efetivos.
A taxa também é alta na Anac (Agência Nacional de Aviação Civil): 32,4%. Dos 1.755 cargos previstos na entidade, 569 estão vagos. A agência realizou concurso recente para preencher 70 vagas e solicitou ao MGI (Ministério da Gestão e Inovação) autorização para outro certame de 256 vagas.
Segundo apurou o Poder360, o cenário tem impactado diretamente o trabalho das agências. Na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), por exemplo, há demora para licenciar alguns medicamentos. Na Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), o atendimento de queixas dos usuários tem ficado comprometido.
Até repasses de recursos setoriais para o poder público têm sido atrasados. Com tamanho deficit de pessoal, a ANM tem limitações para fiscalizar barragens e atrasado repasses de recursos da Cfem (Compensação Financeira pela Exploração Mineral), conhecido como royalty da mineração, para as cidades beneficiadas.
Em junho, pela 1ª vez na história, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) atrasou os repasses dos royalties de Itaipu, uma compensação paga pela usina binacional para as cidades localizadas na sua área de influência no Paraná e no Mato Grosso do Sul.
Também são afetadas autorizações para investimentos importantes em concessões federais de infraestrutura, como em rodovias, portos e aeroportos.
MOBILIZAÇÃO
Diretores das agências têm afirmado que a situação beira o caos e alertado que o cenário pode se agravar. Em demonstração de apoio aos funcionários, nas últimas semanas 5 entidades suspenderam suas reuniões de diretoria ordinárias: Aneel, Anatel, ANP (Petróleo), ANS (Saúde) e ANA (Águas).
No início de junho, os diretores das 11 agências federais divulgaram uma nota conjunta contra o corte de 20% do orçamento feito pelo governo. Afirmaram que as entidades já enfrentam uma “situação crítica orçamentária e de pessoal” e que há risco de paralisia na prestação dos serviços.
Os diretores das agências chegaram a enviar cartas aos seus ministérios gestores pedindo recomposição de cargos. Os ministros Alexandre Silveira (Minas e Energia), Silvio Costa Filho (Portos e Aeroportos), Margareth Menezes (Cultura) e Juscelino Filho (Comunicações) manifestaram apoio e encaminharam os pedidos ao MGI, chefiado por Esther Dweck.
Há uma negociação em curso entre os funcionários públicos de regulação com o ministério. Em resumo, o Sinagências (Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Nacionais de Regulação) pede:
- recomposição de cargos vagos nas entidades de regulação;
- fim do contingenciamento e aumento do orçamento das agências;
- valorização salarial e equiparação dos profissionais de regulação com os que atuam no chamado ciclo de gestão, como carreiras do Banco Central, CGU (Controladoria-Geral da União), Susep (Superintendência de Seguros Privados) e CVM (Comissão de Valores Mobiliários). A categoria alega defasagem salarial de 40% na comparação com os funcionários do ciclo de gestão.
Na 5ª feira (27.jun), funcionários de agências reguladoras realizaram uma ação que incluiu protestos e operação-padrão em vários aeroportos e portos do país. A mobilização chegou a atrasar alguns voos. Na 6ª feira (28.jun), aprovaram uma paralisação nacional de 24 horas para a próxima 4 de julho.
GREVE NO RADAR
Ao Poder360, Fábio Rosa, presidente do Sinagências, afirma que o objetivo é sensibilizar o governo diante da nova rodada de negociação, marcada para 11 de julho. Ele diz que não está descartada a possibilidade de greve caso as tratativas não avancem.
“A negociação com está difícil porque o governo alega uma pressão fiscal muito grande. Não está descartada a possibilidade de greve caso o governo não avance na negociação e não se empenhe em construir uma proposta que contemple minimamente os anseios que a gente está trazendo”, afirmou.
De acordo com levantamento do Sinagências, 2.106 funcionários pediram exoneração e 1.789 se aposentaram desde 2008, resultando em redução de 3.800 trabalhadores da regulação em 16 anos.
Elson José da Silva, presidente da UnaReg (Associação Nacional dos Servidores Efetivos das Agências Reguladoras Federais), afirma que a remuneração atual incentiva os empregados a mudar de órgão ou ir para o setor privado. O governo propôs 9% de reajuste em 2025 + 3,5% em 2026. Uma nova reunião será realizada em 11 de julho.
“A situação é crítica. E esse deficit de pessoas tende a piorar se o governo não olhar com mais atenção para a carreira das agências. Há uma desvalorização salarial que faz com que muitos deixem os cargos nas agências para outros órgãos ou até para a iniciativa privada”, diz.