Setor elétrico vê desafio com apagões causados por eventos climáticos

As mudanças climáticas têm imposto um desafio cada vez maior para a operação das redes de energia elétrica e exigirão ações conjuntas de empresas, entidades e governos. No setor, há uma preocupação crescente com o número de apagões causados pelo agravamento de eventos extremos e o reconhecimento de que é preciso melhorar a previsibilidade e ações de resposta.

Com a maior frequência de eventos climáticos severos no país –como tempestades com fortes rajadas de vento, queimadas e raios–, milhões de consumidores ficaram sem eletricidade nos últimos meses. Os principais episódios foram registrados em Estados do Sul do país, com as fortes chuvas no 2º semestre de 2023, e em São Paulo, com a interrupção do serviço para cerca de 4 milhões de clientes em novembro.

“Nos últimos meses presenciamos eventos climáticos seguidos e cada vez mais severos. Esses eventos ocorreram numa sequência nunca antes vista no país. É uma realidade que temos que conviver daqui para frente”, afirmou o diretor-geral da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), Sandoval Feitosa, durante o workshop “Resiliência de Redes frente a Eventos Climáticos de Elevada Severidade”, realizado pela entidade em Brasília nesta 5ª feira (22.fev.2024).

Feitosa elencou alguns dos eventos e seus impactos:

  • junho de 2023 – fortes chuvas com rajadas de mais de 70 km/h atingiram o Rio Grande do Sul, afetando o fornecimento de energia para mais de 170 mil clientes;
  • julho de 2023 – um ciclone extratropical deixou sem energia 900 mil unidades consumidoras no Rio Grande do Sul, 400 mil em Santa Catarina e 1,3 milhão no Paraná;
  • novembro de 2023 – tempestade em São Paulo interrompeu o serviço de eletricidade para mais de 4 milhões de unidades consumidoras. No mesmo período, o Rio de Janeiro também enfrentou fortes chuvas, afetando 1,3 milhão de consumidores;
  • janeiro de 2024 – chuvas fortes e rajadas de vento acima de 90 km/h causaram a interrupção do serviço de energia em 300 mil unidades em São Paulo e Rio de Janeiro e 100 mil no Rio Grande do Sul.

“Isso mostra que temos um problema que não é só das empresas distribuidoras ou transmissoras. Em eventos dessa magnitude, as distribuidoras e transmissoras não têm condições para responder à altura. Por essa razão clamamos pelo apoio de todos os entes federados”, disse Sandoval Feitosa.

O diretor da Aneel destacou que cada Estado e concessão tem uma realidade diferente e que o foco do setor nesses eventos é restabelecer o serviço. Mas é necessário avançar. “Precisamos melhorar os sistemas de previsão, os protocolos de resposta e a interlocução com o poder público. É indissociável a integração e participação dos governos estaduais e das prefeituras no enfrentamento desse desafio.”

Marcos Madureira, presidente da Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica), afirmou que os indicadores de frequência e tempo de interrupção do serviço de energia estão em queda nos últimos anos no Brasil porque o setor soube se adaptar aos eventos que ele chama de “condições normais”. Agora, a realidade é outra.

“Estamos falando agora de eventos extremos, que estão mais frequentes e têm maior poder de destruição. As distribuidoras estão fazendo seu trabalho. Cada uma tem agregado novas maneiras de projetar e operar suas redes e identificar a forma mais rápida para voltar a energia. Nosso trabalho é acelerar isso e ter um movimento conjunto, disse.

MELHORIAS EM REDES

Madureira cita, além da maior capacidade de previsão e reação, a necessidade de ter redes mais resilientes. Ele afirma que não se deve desconsiderar o uso de redes subterrâneas em algumas regiões onde for viável, mas lembra que esse modelo é mais caro e impactaria as tarifas. “É preciso debater isso. Ver como e quanto custa”.

Investir para transformar as torres, postes e redes áreas mais resistentes ao poder dos ventos é outra medida considerada essencial. No entanto, não se sabe ao certo o quão eficiente seria esse investimento. No segmento de linhas de transmissão, por exemplo, o nível de exigência das torres já está maior, mas ainda assim há episódios graves.

“Antes da vigência da atual regulamentação da transmissão, fazíamos projetos de torres para suportar ventos de 112 km/h. E vimos torres caindo com ventos de 150 km/h. Alteramos os projetos para suportar pressão de ventos de 173 km/h. Ainda assim, caíram torres por causa dos ventos acima disso”, afirmou Mário Miranda, presidente da Abrate (Associação Brasileira das Empresas de Transmissão de Energia Elétrica).

Miranda citou o exemplo de uma transmissora na região Sul do país –que, em 10 anos, registrou 35 ocorrências com 134 torres caídas por eventos climáticos. Também destacou que outro grande desafio para o segmento são as queimadas, que ainda atingem as redes mesmo com trabalhos de prevenção na faixa de domínio dos linhões.

Segundo Christiano Vieira da Silva, diretor de Operação do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), esses eventos exigem uma “mudança na forma de programar o sistema e maior flexibilidade” para que seja possível continuar atendendo à demanda com segurança mesmo com o impacto dos eventos em ativos que afetem a capacidade de escoamento.

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