Qualquer alimento deveria ser mais barato, diz Abia sobre tributária

A Abia (Associação Brasileira da Indústria de Alimentos) é crítica quanto à eficácia da taxação seletiva sobre bebidas açucaradas na reforma tributária. O “imposto do pecado” foi incluído no PLC (projeto de lei complementar) 68 de 2024 por sugestão do governo para desencorajar o consumo de produtos considerados nocivos à saúde. Na lista, também estão incluídos itens como cigarro e cerveja.

Para o setor que representa a maior parte da indústria do país, a iniciativa pouco será útil ao combate à obesidade e às doenças crônicas, como propõe quem a defende. Seu principal efeito, diz a associação, será o de pesar no bolso do consumidor.

As pessoas dizem que a indústria tem que pagar mais caro. Mas não nos enganemos, essa é uma reforma do consumo, não é da renda. O que se paga a mais é o consumidor quem vai pagar”, afirmou o presidente da entidade, João Dornellas, em ao Poder360.

Assista à entrevista completa (xxx): 

Os países da América Latina e do Caribe são onde mais se gasta com a alimentação. Principalmente, numa dieta saudável. No Brasil, o custo médio de um prato nutritivo é de US$ 3,10, por volta de R$ 16,50. É 4 vezes mais que o valor de uma dieta calórica mínima, com custo de US$ 0,8 (R$ 4,00). Só 14,5% da população brasileira não tem acesso a uma dieta equilibrada.

Os dados são do relatório do Atlas dos Sistemas Alimentares do Cone Sul, compilação de dados organizada pela Fundação Rosa Luxemburgo. Eis a íntegra (PDF – 9 MB).

 Nesse cenário, o presidente da Abia defende que a indústria tem um papel importante no combate à insegurança alimentar e toda comida deveria ser barateada. “Subir o preço do alimento da indústria não vai baixar o preço da fruta. Uma coisa não tem nada a ver com a outra, só encarece no geral”, afirmou.

Precisamos aproveitar o momento para fazer justiça social por meio do alimento e colocar ele mais barato na mesa do brasileiro”, completou.

Leia detalhes sobre a taxação de alimentos proposta pela reforma:

Junto às discussões sobre a taxação de alimentos foi reanimado um debate quase tão antigo quanto a proposta de reforma da tributação: o consumo de ultraprocessados no Brasil. A categoria é composta por produtos com maior manipulação industrial. Costumam ter alta quantidade de aditivos, como corantes e realçadores de sabor.

Médicos, nutricionistas, organizações da área da saúde e outros representantes do setor se movimentaram para que o grupo de alimentos fosse incluído no rol do “imposto do pecado”. Não deu certo. O governo incluiu as bebidas açucaradas e com adição de conservantes na taxação, mas não ampliou para outros alimentos industrializados.

Além de contrária à taxação, a Abia também questiona o próprio termo utilizado por representantes da comunidade médica. “Ultraprocessados é uma terminologia inútil”, afirmou o presidente João Dornellas.

O setor discorda do conceito e não o utiliza para qualquer tipo de classificação. Seus argumentos principais são:

  • é uma categorização ampla – a indústria discorda de que seja possível considerar igualmente danosos todos os alimentos que fazem parte do grupo. Argumenta que embutidos e iogurtes ou biscoitos recheados e fórmula infantil não podem ser comparados. Para o setor uma classificação tão ampla é vazia.
  • a tecnologia de alimentos não ultraprocessa–  a Abia entende que o termo não tem respaldo no campo da tecnologia de alimentos e passa uma impressão incorreta sobre o processo. “É algo caro, você faz o processamento na medida. Parece que foi mais processado do que deveria ser e isso não existe”, diz Dornellas;
  • a indústria cumpre regras sanitárias – o presidente da associação que representa o setor considera que o termo favorece uma ideia de que o alimento traz perigo. “Nós não fazemos nenhum tipo de alimento que seja nocivo para o ser humano. Se assim fosse, as nossas autoridades regularas já teriam proibido ele de ser fabricado”.

A Abia é contrária a qualquer tipo de classificação a grupos alimentares. Defende que “alimento é alimento”. Para João Dornellas, as discussões a partir da reforma tributária deveriam ter outro foco: “Precisamos aproveitar o momento para fazer justiça social por meio do alimento e colocar ele mais barato na mesa do brasileiro”.

A entidade avalia que o setor, que representa 10,8% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional, tem papel importante para o fim da insegurança alimentar no país.

A indústria de alimentos em números, segundo dados da Abia:

  • engloba 38.000 empresas – 94% delas são de micro e pequenas e 6% de médio e grande porte, incluindo multinacionais;
  • emprega 2 milhões de pessoas diretamente;
  • tem faturamento total de R$ 1,16 trilhão.

O QUE SÃO PROCESSADOS

O grau de processamento de alimentos diz respeito a alterações que são feitas nos produtos. Não necessariamente é algo ruim. Segundo a indústria de alimentos, esse procedimento é responsável por tornar muitos alimentos palatáveis e mesmo comestíveis. 

Por outro lado, alguns acadêmicos afirmam que o processamento realizado em diversas etapas em alimentos pode trazer danos à saúde. 

Leia abaixo um resumo do que é cada categoria: 

A maioria (53,3%) dos alimentos consumidos pelos brasileiros são in natura ou minimamente processados, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) compilados por um estudo da USP (Universidade de São Paulo). Eis a íntegra (PDF – 305 kB).

Os “ultraprocessados” integram 19,7% da dieta da população. Já os processados ocupam 15,8% do espaço. 

A DIETA DO BRASILEIRO

Segundo informações levantadas pela Fundação Rosa Luxemburgo, o custo para se alimentar de forma saudável no Brasil é mais alto do que uma dieta mínima. Eis a íntegra (PDF – 9 MB). 

O valor médio para ter uma alimentação com a carga nutricional mínima no país é de cerca de US$ 0,80. Já o da refeição considerada saudável é de US$ 3,10.

O Brasil tem a 2ª dieta mínima mais cara dentre as nações do Cone Sul. Está atrás só do Paraguai (US$ 0,90). 

Já para alimentação saudável, o Brasil fica em 3º lugar no ranking de custo. À frente, estão Paraguai (US$ 3,90) e Argentina (US$ 3,70). 

O Brasil tem 14,5% da população sem acesso a uma alimentação saudável. Tem o 2º pior índice dentre os países do Cone Sul. 

O brasileiro também lidera a lista de consumo de sódio dentre os países da OEA (Organização dos Estados Americanos). O excesso do sal para o país é de 545,9 mg. Em seguida estão Colômbia (491,3 mg) e Uruguai (467,1 mg). Os dados são da OPAS (Organização Pan-Americana da Saúde). Eis a íntegra (PDF – 970 kB).

Leia abaixo o detalhamento:

O SETOR

A Indústria de alimentos movimentou R$ 1,2 trilhão em 2023, segundo dados da Abia. Esse valor equivale a 10,8% do PIB (Produto Interno Bruto). A divisão dos valores se dá dessa forma:

  • mercado interno – R$ 851 bilhões;
  • exportações – R$ 310 bilhões.

A associação afirma que o setor criou 350 mil novos postos de trabalho no ano –sendo 70.000 diretos e 280 mil indiretos. O total de pessoas empregadas por causa da indústria soma 1,97 milhão. 

Os produtos do setor que são mais consumidos nas casas das famílias brasileiras são: 

  • carnes, pescados e derivados – 25,1% do consumo total;
  • laticínios – 16,5%;
  • cereais, chás e cafés – 16,5%
  • óleos e gorduras – 9,1%;
  • snacks, sorvetes e temperos – 8,5%. 

Os Estados do Sul e do Sudeste são aqueles que mais consomem alimentos processados, segundo os dados do IBGE.

O ranking usa como base a contribuição energética na dieta da população das unidades da Federação. O top 5 no consumo de processados é composto por:

  • Santa Catarina – 23,2% da energia consumida;
  • São Paulo – 22,3%;
  • Distrito Federal – 21,7%;
  • Amapá – 21,1%;
  • Paraná – 20,2%. 

O mercado global de alimentos tem 34% de concentração em 10 grandes empresas: 

Adicionar aos favoritos o Link permanente.