A Shell quer expandir suas operações no Brasil nos próximos anos. De acordo com o presidente da petroleira no país, Cristiano Pinto da Costa, 49 anos, nos planos da empresa há novos projetos de exploração e produção de petróleo e gás natural, próprios ou em parcerias. Também há estudos mirando a transição energética nas áreas de energias renováveis e investimentos em biocombustíveis.
Ao Poder360, Cristiano defendeu a abertura de novas fronteiras exploratórias brasileiras, como a Margem Equatorial, no Norte, onde há blocos aguardando aval para pesquisas; e a Bacia de Pelotas, no Sul, onde adquiriu 29 blocos em sociedade com a Petrobras em 2023. O executivo disse que vê potencial na região.
“A Shell acredita no potencial geológico da Margem Equatorial. Olhando o que está acontecendo na Guiana, que teve crescimento de PIB de 58% no ano passado por causa do desenvolvimento da indústria de exploração e produção, no Suriname e na costa da África, que é tudo parte da Margem Equatorial também, a indústria acredita nesse potencial geológico e a Shell corrobora com essa visão”, afirmou.
O presidente da petroleira britânica no Brasil acredita que a decisão de conceder a licença para pesquisas na região será “uma das decisões mais estratégicas na área de energia que este governo precisará tomar”. Afirmou que para testar todo esse potencial é preciso a perfuração, que deve ser feita de forma segura e com sarrafo alto na área ambiental, como sempre ocorreu no setor.
“Tem que fazer os poços exploratórios e testar se aquilo que você acredita está lá. Depois decide se quer investir ou não para gerar e monetizar as receitas desse potencial geológico. Mas isso precisa ser feito com celeridade, porque a janela de oportunidade pode fechar. Os grandes atores internacionais estão olhando para os outros países: Guiana, Suriname, Namíbia, que são bacias exploratórias novas que estão atraindo bastante a atenção do investidor internacional”, disse.
A Shell é a 2ª maior produtora de petróleo do Brasil, com mais de 400 mil barris diários. Só perde para a Petrobras. Operando no país há 111 anos, conta com unidades em produção com operação própria ou com terceiros, como a Petrobras em vários campos do pré-sal.
Em maio, a petroleira confirmou que investirá com a Petrobras no projeto Atapu 2, com a 2ª plataforma de produção do campo de Atapu, no pré-sal da bacia de Santos. A britânica também está na fase final de estudos do projeto Gato do Mato, sua descoberta própria na bacia de Santos. Deve bater o martelo final sobre o investimento em 2025.
“A gente tem uma visão de potencial do Brasil para continuar crescendo na área de exploração ainda muito grande. A Shell continua acreditando no futuro onde o mundo vai precisar de hidrocarboneto e acreditando no Brasil como um grande produtor e supridor. E estamos tomando os passos nessa direção”, afirmou Cristiano.
Assista à íntegra da entrevista (54min33s):
Nesta semana, a Shell lançou o estudo “Cenários Sketch”, analisando 2 cenários potenciais para a transição energética no país nos próximos anos. Essas prospecções mostram que há espaço para a expansão do setor de petróleo e gás no Brasil nos próximos anos e que isso poderá ocorrer juntamente com a transição energética, dando ao país segurança de suprimento nesse período. Eis a íntegra do estudo (PDF – 12 MB).
Os 2 cenários foram traçados a partir de metas para reduzir a emissão de CO2. Ambos mostram que a produção de petróleo bruto no Brasil deve saltar dos atuais 3 milhões de barris diários para 4 milhões em 2035. E esse volume pode atingir 5,7 milhões de barris em 2050, no cenário 1, com aumento do consumo interno de energia e maior demanda global para exportações.
Na avaliação de Cristiano Pinto da Costa, o Brasil terá uma janela de oportunidades com a transição energética em várias frentes. E elas incluem o setor de petróleo, assim como os biocombustíveis e as energias renováveis. Como o país já tem uma matriz mais limpa que o resto do mundo, larga na frente.
“O Brasil tem uma oportunidade de progredir em todas as frentes. Às vezes se erra no debate de achar que a transição energética é fazer 100% de uma coisa e 0% da outra. Por isso é chamado de transição, e não ruptura energética. Vamos andar com velocidades diferentes a depender do país. Então o Brasil tem a oportunidade de continuar avançando no renovável, no biocombustível, no mercado de carbono, mas também na exploração e produção de óleo”, afirmou.
Assista ao trecho (3min48s):
Olhando esse horizonte, a Shell tem ampliado investimentos em projetos verdes. Através da Raízen, sua joint venture com o grupo Cosan, planeja construir 9 plantas de etanol de 2ª geração. Duas já foram inauguradas –a última em maio. Outras 7 ainda serão construídas, número que pode ser ampliado futuramente. A empresa também estudará a produção de SAF (Combustível Sustentável de Aviação).
Na área de energias renováveis, há estudos da petroleira para construir parques fotovoltaicos no Brasil que somam 2 gigawatts de projetos. Ainda não há decisão final de investimento, o que pode acontecer de 2025 a 2030. A Shell também analisa projetos de eólicas offshore, mas não vê a área como prioridade no momento.
Carga tributária e falta de leilões preocupam
Cristiano Pinto da Costa afirma que, para o Brasil continuar tendo relevância no setor de petróleo no futuro, precisará manter a competitividade do setor. Dados do IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo e Gás) mostram que a cada 3 barris extraídos no país, 2 ficam para o governo como tributos, royalties e participações especiais.
O executivo cita o imposto seletivo, criado na reforma tributária, que poderá incidir sobre a extração de bens naturais com alíquotas de até 1%. “É uma carga tributária já bem pesada. Então uma preocupação que nós temos é do Brasil não aumentar ainda mais essa carga tributária e perder a competitividade”.
Há uma preocupação também com a possibilidade de não ser realizado leilão de blocos exploratórios de petróleo em 2024. A ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) já admitiu que possivelmente uma nova oferta só ocorrerá em 2025, encerrando um ciclo de pelo menos 1 leilão por ano desde 2017.
“É importantíssimo o Brasil continuar tendo leilões recorrentes anuais de blocos de exploração e produção. A gente passou período de 5 a 6 anos na indústria sem leilões e aquilo foi muito danoso especialmente para a cadeia de suprimento. Uma sequência de leilões é extremamente importante para manter a competitividade do Brasil”, diz o executivo.
Ele continua: “Companhias como a Shell ou outras grandes que têm um balanço robusto conseguem conviver sem uma carteira de projetos por alguns anos. Se você olhar a ponta, a cadeia de suprimento, que é o fabricante de válvula, de bombas, de máquinas específicas, ele tem muito mais dificuldade de ficar vários anos sem contrato”.